Era uma
segunda-feira. Acordei e me dei conta de que no dia seguinte faria um ano que
parti para uma viagem surpreendente e até maluca, como diriam alguns. Eu
pensei: um ano!
Em vez da
alegria que me é comum, um sentimento áspero de nostalgia tomou conta da manhã.
Não era tristeza daquelas que doem. É daquele tipo que aperta. Como alguém que
segura um pedaço da pele do nosso braço e torce lentamente com a ponta dos
dedos. Não dói, mas incomoda, invade, aflige.
Por que
alguém ficaria triste com a lembrança de uma das melhores fases da vida? Não
sei, apenas fica. Nada de arrependimento, de dor, de insatisfação.
Somente o
desejo de querer voltar, de reviver, de reexistir, de reexperimentar, de sentir
aquele frio na barriga ao olhar para trás, por cima do ombro, e dizer
silenciosamente aos que ficam: eu vou ali estender um pouco a estrada da minha
existência, mas logo volto.
Porque o
caminho que a gente constrói nos leva ao desconhecido, mas sempre permite a
volta pelas veredas já trilhadas na vida.
Os sintomas
Algumas
lágrimas molharam a segunda-feira nublada, estremeceram o coração e magoaram
essa caixinha que chamamos de corpo. Logo que cheguei em Portugal, descobri que
quando alguém fica magoado, significa que foi ferido fisicamente. Não é a mágoa
emocional, aquela que de cara associamos à decepção ou à ofensa.
Eu estava
magoada. E naquela noite de início de semana, a garganta fechou, a temperatura
do corpo subiu, as costas se comprimiram. A melancolia logo deu lugar à dor
física. Sim, essa que faz a gente desengavetar termômetro, correr para a
farmácia e entupir a cabeceira da cama de caixinhas coloridas e de nomes
estranhos. De oito em oito horas, elas nos lembram o quanto somos frágeis e
estranhamente voláteis.
O
diagnóstico
Quem
tropeçava em mim durante a semana dizia: “ah, esse clima louco faz isso com a
gente”. Eu ouvia, concordava, e tentava encontrar os motivos para estar tão
vulnerável. Na sexta-feira, quando a semana já ia se abraçando ao esperado
repouso, em uma reunião, fui questionada sobre estar doente:
– Você está
assim porque tem algo a falar e não está sendo ouvida?
A pergunta
foi abrupta. Não era a indagação que as pessoas estavam me fazendo nos últimos
dias, com ligeiras associações ao tempo chuvoso na cidade. E eu sutilmente
lembrei da infância e de um livro que havia na casa da minha mãe. Falava sobre
a origem emocional para as dores físicas. Lembrei de como me sinto cada vez que
a garganta dói e daquele sentimento de que preciso falar algo importante a
alguém. Só que não sai.
A cura
Até aquele
momento de provocação, bem ali na minha frente, eu não havia me dado conta de
que a dor era apenas um desejo de gritar. Até então, não havia uma conexão
clara entre a tristeza pela manhã e a fragilidade na noite da segunda-feira.
Existe uma
ponte entre os dois momentos, por isso, a influência dos sentimentos sobre a
saúde física já está sendo tão estudada. Nosso corpo é uma máquina mágica e,
acima de tudo, inteligente. Há uma linha muito tênue dividindo o nosso sentir
físico do nosso sentir emocional e, no dia a dia, automaticamente estamos buscando
o equilíbrio entre esses dois “sentires”.
Parece
simples e óbvio, não é mesmo? Mas acontece de forma muito involuntária, baseada
na forma como reagimos às situações que se apresentam. Não é uma reação
consciente e somente quando me dei conta, eu pude ver com clareza o que era
necessário para eu curar aquela feridinha invisível.
Além dos
cuidados médicos, eu precisava restaurar o equilíbrio, resgatar o amor pelo
presente, perceber que nem sempre vamos estar fazendo o que desejamos. Entre
uma colherada de xarope e outra, podemos nos preparar para esses futuros
momentos que intimamente ansiamos. Dar um novo significado ao agora é o que nos
fortalece para a etapa seguinte.
O olhar
costuma estar voltado para o objetivo em si, mas, e como chegar até ele? O
caminho às vezes é chato, árduo, longo… mas faz parte da jornada. Entender o
sentido de cada ciclo é ter a liberdade e a consciência de que cada nuance do
seu caminhar é extremamente necessária para o seu chegar.
Fonte: O SEGREDO. Por :CARLA CABRAL
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